Lidio Lopes faz campanha para conselheira tutelar em culto evangélico

A tentativa do deputado estadual Lídio Lopes (Patriota) de angariar votos à uma irmã de igreja que disputa a reeleição ao cargo de conselheira tutelar, deverá causar efeito contrário e tirar a mulher do páreo, por abuso de poder religioso.

Durante culto na igreja União da Mocidade da Assembleia de Deus - Missões (UMADECAMP), Lídio Lopes pediu aos fiéis que estavam na plateia votos para a pastora Indiani Carolini Domingues Mercado da Silva, esposa do também pastor Wellington Gomes.

O primeiro a se manifestar durante o culto, e que também poderá acabar prejudicando a candidatura de Indiani, foi o marido da conselheira, o pastor Wellington Gomes.

“Antes da oração, deixa eu dar um recado aqui rapidamente. Quem aqui tem título de eleitor e vota? Levanta a mão assim. Você sabia que agora, dia 1º de outubro, tem a eleição para o Conselho Tutelar? Não? Tá sabendo agora. Eu preguei a palavra e tudo que estava travado vai ser destravado", disse o religioso.

E prossegue: "A primeira coisa é você começar a votar no Conselho Tutelar, tá? E deixa eu dar uma notícia melhor ainda: a mulher mais bela de Campo Grande, a minha esposa, ela já passou na primeira etapa que é a prova, a segunda etapa que é informática ela passou também e amanhã é o teste psicológico, mas no dia 1º de outubro, para dar tudo certo, para confirmar e já está confirmado nos céus, agora será confirmado na terra em nome de Jesus, ela vai ser eleita".

Ao final, troca o proselitismo religioso pelo político: "Você vai fazer com que ela chegue lá. ‘Pastor, como que eu faço?’ Você tem que ir no seu local, na zona eleitoral e votar. Qual é o número? É muito fácil: 29992. Nós vamos estar enviando para os líderes de setor, líderes de congregação e você faça esse esforço de estar lá porque certamente você vai abençoar as nossas vidas e você também será abençoado”.

Cabo eleitoral

Na sequência, após a fala de outro religioso, identificado no vídeo como pastor Gerson, o deputado Lídio Lopes pega o microfone e se manifesta:

"Isto que o irmão acabou de colocar aqui é muito sério. Muito sério mesmo. Eu fui vereador em Campo Grande, como candidato da igreja e estou no quarto mandato como deputado estadual, pela igreja, e a Adriane hoje é prefeita de Campo Grande, pela igreja, missionária desta igreja. Mas nada mais importante do que termos irmãos e irmãs no Conselho Tutelar, porque é lá que começa tudo, meus amados", discursou Lídio Lopes.

E então, pede o voto: "então, ore e ajude, mas ajude mesmo. Dia 1º vai lá na sua seção, leva o comprovante da sua residência e vote! Vote na nossa irmã (se referindo à candidata Indiani Domingues) e em outros irmãos que estarão disputando”.

Efeito contrário

A conduta do parlamentar, caracterizada como abuso de poder religioso e favorecimento, é vedada pelo edital que estabelece as regras da eleição, podendo vir a prejudicar a pastora-candidata.

No artigo 4°, a norma estabelece as vedações, que poderão ser consideradas aptas para gerar a inidoneidade moral do candidato:

VI – abuso do poder religioso, assim entendido como o financiamento das candidaturas pelas entidades religiosas no processo de escolha e veiculação de propaganda em templos de qualquer religião, nos termos da Lei Federal nº 9.504/1997 e alterações posteriores;

VII – favorecimento de candidatos por qualquer autoridade pública ou a utilização, em benefício daqueles, de espaços, equipamentos e serviços da Administração Pública Municipal.

Anulação dos votos

O Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA) de Campo Grande abriu procedimento para apurar a denúncia contra o deputado estadual Lídio Lopes (Patriota) por abuso de poder político e religioso.

De acordo com o site MS em Brasília, a secretaria-executiva do CMDCA diz que a denúncia chegou ao Conselho na terça-feira (19).

O vídeo no qual Lídio Lopes, esposo da prefeita Adriane Lopes, aparece pedindo votos durante o culto evangélico, já está em poder do CMDCA.

O CMDCA informou ainda que eventual decisão sobre a denúncia terá efeito, independentemente da votação, ou seja, mesmo que a candidata citada seja votada em 1º de outubro, qualquer decisão sobre impugnação será aplicada. Se isso ocorrer após a eleição, os votos dados à Indiani Domingues não serão considerados.

Análise fática

Henrique Neves, ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e atualmente advogado eleitoral, em entrevista ao G1, falou a respeito de vedações estabelecidas nas eleições gerais de 2022.

"As manifestações pessoais, seja do clérigo ou de quem conduz a cerimônia, falar 'eu gostaria de votar, eu vou votar', isso é tolerável. Não importa a religião. O que não pode fazer é transformar uma cerimônia religiosa em um ato de propaganda eleitoral, uma missa em comício", afirma.

As regras previstas na Lei Federal n. 9.504/1997 (eleições gerais de 2022), segundo o edital, aplicam-se nas no certame para a escolha dos conselheiros tutelares.

Reeleição

Nas eleições realizadas em 2019, para o quadriênio 2020/2023, com 210 votos a pastora Indiani Domingues ficou na 13ª colocação na relação dos 25 candidatos que conquistaram vagas de suplentes.

O resultado foi anunciado pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA) após os candidatos terem sido submetidos à avaliação de informática, avaliação escrita sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e avaliação psicológica.

A pastora sequer apareceu na lista com os nomes dos 25 candidatos mais votados. O primeiro colocado conquistou 1.050 votos e o 25º recebeu o voto de 268 pessoas.

Eleição 2023

De acordo com o Edital, serão preenchidas 5 vagas para membros titulares e 10 vagas para seus consequentes suplentes, sendo 8 Conselhos para o Município de Campo Grande para o quadriênio 2024/2027.

Ao todo, 112 candidatos disputam a eleição, que acontece no dia 1º de outubro. Qualquer cidadão que esteja em dia com a Justiça Eleitoral pode votar. A eleição será das 8h às 17h.

A votação vai ocorrer em 56 polos, distribuídas pelas áreas urbana e rural. Clique aqui e veja os locais de votação.

A remuneração mensal é de R$ 5.946,26, para a jornada de trabalho de 8 horas diárias, além dos regimes de plantões noturnos, de finais de semana e feriados.