Nem faz tanto tempo...
Sexta-feira, 29 de Novembro de 2024 - 17:31 | Redação
Luciano Martins *
O clima temperado continental marcava o inverno rigoroso daquele novembro de 1924. Adolf Hitler, então com 35 anos, cumpria pena na Fortaleza de Landsberg, na Baviera, após sua condenação a cinco anos de prisão pela tentativa de golpe conhecida como Putsch da Cervejaria.
Inspirado na Marcha sobre Roma de Mussolini, o plano fracassado buscava tomar o poder na Baviera como prelúdio para dominar toda a Alemanha. Hitler cumpriu apenas cerca de nove meses, libertado graças à pressão de simpatizantes e à indulgência das autoridades, já impressionadas com sua retórica. Durante o encarceramento, ditou suas ideias a Rudolf Hess, que as transcreveu no manifesto Mein Kampf.
Naquele momento, o Partido Nazista, liderado por Hitler, tinha uma presença ínfima, conquistando apenas 6,5% dos votos em 1924 e afundando para 2,6% em 1928. Ele era uma figura marginal em uma Alemanha devastada, mas o desespero social e as crises econômicas globais, como a Grande Depressão de 1929, catapultaram-no para o centro do cenário político.
Em poucos anos, o partido alcançou 18% dos votos, e, em 30 de janeiro de 1933, Hitler foi nomeado chanceler. Sua ascensão meteórica foi impulsionada por uma estratégia minuciosa de manipulação das massas e pelo uso sistemático da mentira como instrumento de poder.
Em 1939, esse domínio sobre a narrativa mostrou seu impacto devastador. A invasão da Polônia, que deu início à Segunda Guerra Mundial, foi justificada por uma farsa: um suposto ataque polonês a uma estação de rádio alemã, encenado pelos próprios nazistas.
Essa mentira, repetida e amplificada, serviu de pretexto para desencadear um conflito que levaria milhões à morte e marcaria a história moderna como o maior exemplo de como o poder absoluto é capaz de moldar a realidade e justificar atrocidades.
Ao longo dessa linha do tempo, o que permanece constante é o Poder. Ele surge como força motriz, atravessando as décadas, manipulando narrativas e decidindo os rumos da história, seja pela força, pelo discurso ou pela mentira.
Quase um século depois, os ecos desse período permanecem aterradoramente vivos. As ferramentas mudaram, mas o jogo é o mesmo. Se antes a propaganda era veiculada por jornais e rádios, hoje ela se propaga pelas redes sociais com uma velocidade e um alcance sem precedentes.
A desinformação, herdeira direta da manipulação nazista, continua a criar opiniões, corroer instituições democráticas e ameaçar os alicerces da liberdade.
Não estamos falando de um passado remoto. Foi logo ali, na mesma linha de tempo que ainda percorremos. As feridas daquele período não cicatrizaram, e os ventos da barbárie ainda sopram, lembrando que, enquanto o ódio e o poder se entrelaçam nas sombras, a verdade, aguarda impassível para emergir como farol da humanidade, desafiando os rumos que tentam talhar a história.
* Luciano Martins é advogado, professor e vice-presidente da União Brasileira de Apoio aos Municípios (UBAM) no Estado de Mato Grosso do Sul. Atuou como secretário-adjunto de Governo, controlador-adjunto e diretor-presidente da Fundação Social do Trabalho no Município de Campo Grande (Funsat).